sábado, 24 de setembro de 2011

"Há medo em meu jardim, pois uma rosa disse adeus pra mim..."

      22 de setembro de 2011, 22h45... A uma hora e quinze minutos da chegada da primaveraeu observava a última noite fria de inverno. Contemplava uma noite gélida, sem lua, sem estrelas...tudo parecia tão escuro, mas com a triste ilusão que a meia noite, quando a próxima estação chegasse, tudo seria diferente. O brilho do firmamento fosse voltar a sorrir e a estação mais fria nos daria adeus.
      22h54, um telefonema. Ao identificar o número um aperto em meu coração. Diante daquela situação eu sabia que não seria um telefonema qualquer pra me desejar uma feliz primavera que estava por vir. Tive medo do que poderia ouvir, mas mesmo assim atendi. Uma voz trêmula forçando uma muito falsa segurança me perguntava se estava tudo bem. Ouvindo aquele choro reprimido que se escondia atrás daquelas palavras que sufocaram ainda mais meu coração, eu ousei dizer que estava bem, mesmo sabendo que depois das próximas palavras nada mais estaria bem, pelo menos não naquela noite. O que eu temia acabara de acontecer... Àquela noite não haveria a passagem da primavera. O Supremo, único responsável pela criação de todas as coisas, inclusive das estações, definiu, ainda não sei o porquê e quando tudo é muito recente fica difícil a gente perguntar pra quê, mas Ele definiu que excepcionalmente este ano a primavera haveria de esperar pelo menos mais um dia para dar o ar da graça.

      Uma lágrima rolou...foi inevitável. Depois outra... e outra...

      Estava ali ansioso na esperança de poder ver a minha doce primavera chegar, e derrepente ela resolveu parar no caminho para recuperar o ar e postergar a sua chegada.

      Nesta noite a lua não brilhou no céu. As estrelas não tinham motivos para iluminar. Noite longa demais! O vento soprava e assobiava um canto triste de se ouvir. Os amantes da noite não tinham a trajetória da lua no céu para passar o tempo observando seu passeio e nem as estrelas para contar. Noite muito longa, em que a primavera não chegou...

      Ao amanhecer, o sol mostrou que não tinha motivos nenhum para mostrar o brilho do seu sorriso. Como um bom trabalhador veio cumprir sua missão de aquecer, mas permanece escondido atrás das nuvens, e estas por sua vez, perderam sua pureza alva e se acizentaram de tristeza por não verem a primavera.

      O jardim, onde todos eram os que mais esperavam a entrada da próxima estação, amanheceu dormindo. As flores com suas folhas e pétalas fechadas se voltavam para o centro do jardim, pois esta noite a mais bela flor nos deixou...

      Todas as flores sabem que um dia voltarão à terra de onde, ainda semente, brotaram e tiraram todo o sustento para viver. Mas nenhuma delas espera que isso aconteça na entrada da primavera. Todas ensaiavam juntas um canto novo para o tão sonhado despertar do dia 23 de setembro. Cada uma adornava suas pétalas com o brilho mais bonito que pudessem. E os perfumes? Ah, os perfumes! Cada qual com sua particularidade contagiava e apaixonava quem quer que os sentisse. Juntos, todos formavam um gostoso aroma dos campos. Mas esta noite um perfume deixou de ser exalado...e mesmo que cinco mil outras flores exalassem seus perfumes ao mesmo tempo, um aroma vai estar faltando neste jardim.

      Aquela parecia ser a flor mais forte do jardim. Raízes profundas, muito segura de si, linda por natureza e nem assim deixava sua vaidade se transformar em prepotência, além da mais linda era também a mais humilde. A vaidade existia na busca de encantar ainda mais quem a olhasse, pois era feliz em saber que fazia feliz também quem a admirasse e sentisse seu perfume. E na busca pela perfeição em transformar suas pétalas, que já eram tão belas, em veludos cintilantes foi que ela passou seus últimos dias de inverno. Adornava-se  para encantar a primavera, que ela nem pode ver chegar...

      Hoje o jardim chora, mas de saudade que todos já sentem daquele brilho em seu meio. Todos sabem que aquela flor não os deixou, e que hoje ela apenas se tornou adubo para suas raízes. Tudo o que aquela flor foi enquanto enfeitava aquele jardim, vai fortalecer as raízes das flores que ficaram. Ninguém esperava que fosse assim, pois ela sequer disse adeus, mas talvez soubesse que não deveria se despedir já que na verdade ela nunca os deixará, apenas irá alimentá-los.

      Para se ter vida é preciso morrer, e esta noite ela sofreu as dores do parto mais uma vez. Dormiu e não acordou mais em nosso meio, mas acordou para a vida. Acordou para nossas vidas e a partir desta noite faz parte do nutriente de nossas raízes.

      E a primavera?

      É preciso força da parte das outras flores para mostrar pra ela tudo o que foi ensaiado durante outras três estações, e mesmo com o seu atraso o espetáculo sempre tem que ser único, pois se aquela flor ainda estivesse ali não deixaria nenhuma outra flor desanimar, e mesmo que a primavera do ano de 2011 comece no 24 e não no dia 23, é a primavera...com mais adubo em nossas raízes é que devemos mostrar a ela a beleza de nossas pétalas...


2 comentários:

  1. Não tenho forças pra dizer muita coisa (nem tenho conseguido falar mt mesmo), mas agradeço de coração pela homenagem a ela! Ela gostava muito mesmo de você!
    Beijos,
    Lívia.

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